Saturday, August 08, 2009

 

Dose dupla

Continuo em atividade no Blog do Giancarlo Galdino, no portal Wordpress. Por enquanto, apenas lá. Como diria o mais novo amigo de infância do Cara, não me deixem só.

Tuesday, March 31, 2009

 

Rumo ao século XX?

A obrigatoriedade de certificação acadêmica para o exercício da atividade jornalística é um atraso maior do que se imagina


O próximo julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF), hoje, 1º de abril, pode tornar-se histórico, a depender do que entendam os ministros quanto à necessidade de formação acadêmica em jornalismo para a atuação profissional em órgãos de imprensa. Se os magistrados sentenciarem o fim da exigência do diploma para que se desempenhe o ofício de jornalista, de fato a História do Brasil sairá enaltecida. No caso de se dar oposto, o que se vão conjugar são a vergonha e o obscurantismo.

A imposição do diploma para conquistar posto em empresas jornalísticas no Brasil é uma excrescência, que remonta aos primórdios do regime militar, quando também brotou das cabeças mais brilhantes da intelligentsia de então a idéia de implantar no país lei para cercear, de modo absoluta e incontestavelmente legal, o fazer jornalístico: a lei nº 5250, de 9 de fevereiro de 1967, a famosa Lei de Imprensa.

Mais de quarenta anos de um entulho que, oh! ironia, foram redivivos justamente por aqueles que deveriam zelar pelo progresso e pela seriedade do jornalismo: os próprios jornalistas. Mas, felizmente, só pelos piores. Apenas pelos que em anos de carreira nunca conseguiram, por mais que tenham tentado, um lugarzinho sequer na grande imprensa — tampouco na imprensa grande — ou, se o granjearam, foram de lá enxotados por mentir, pagar por informações, traficar influência, caluniar, difamar, injuriar e por ser somente medíocre mesmo, afinal, ninguém gosta de sustentar vagabundo e ainda há os jornais, televisões, rádios e agências de notícias que na se deixam patrulhar pelo politicamente correto e valorizam os talentosos em detrimento dos bonzinhos. O último refúgio da canalha, composta de detentores do canudo (ou do contrário, não ficaria pulando de faculdade em faculdade atrás de cooptar e aliciar os incautos) é o sindicalismo, no qual ganham sem ter de prestar contas como se deve e sem a presença constante do espectro do desemprego, que vive a assombrar os que têm sede por ser melhor dia após dia, na atual conjuntura ainda mais, e pagam suas contas valendo-se só do seu trabalho e não do proselitismo vigarista das entidades de classe.

Toda essa questão nada mais é que recalque de uma gente cabotina, rombuda, ultrapassada. E não me venham dizer que eles prezam pela catiguria, porque ter um certificado seja do que for não é nem será em tempo algum garantia de coisa nenhuma. Nem deve ser. O destino de maus profissionais de imprensa, ou quaisquer outros, deve ser o olho da rua, tenham ou não passado pelos bancos de uma universidade ao cursar jornalismo ou corte-e-costura. Uma das verdades que ouso apontar nesse arrazoado é que os jornalistas cuja formação é claudicante estão tremendo nas bases, amedrontados mesmo com a possibilidade de perder seus empregos para profissionais que julgam inferiores, sendo que inferiores são eles. Se não vejamos: o que é mais legítimo, para tornar à área de trabalho que listei junto ao jornalismo na quarta oração deste parágrafo, uma ex-modelo ter um quadro em que discorre sobre moda em um programa de televisão ou mesmo ancorar uma tração voltada a este segmento ou assumir essa posição um(a) jornalista de moda, muitas das mulheres gordotas (Freud explica), formado(a) comme il faut, que poderia muito bem ter frequentado o curso de filosofia, por exemplo, mas que preferiu comunicação social, não pelo fato de o curso apresentar currículo mais abrangente, e sim porque as pessoas nesse ambiente são mais hype, mais descoladas? Tenham dó.

A quem interessa que o diploma torne-se obrigatório? Não vejo, nem nunca vi, jornalistas nos grandes veículos de comunicação sustentarem esse argumento. Pelo contrário; para eles, seguros que são de sua habilidade profissional, quanto mais pluralidade, melhor. A obrigatoriedade do diploma só desperta a simpatia dos ruins, dos sindicalistas pelegos, que querem varrer do jornalismo de uma vez por todas a liberdade de pensamento para aparelhar a imprensa conforme sua ideologia rastaquera. Enfim, essa é uma questão política. Trata-se de um projeto de poder, que vai soçobrar porque, ao cabo, quem controla o jornalismo é a opinião pública, é o próprio povo, e é também o mercado, pois nada pior que para uma empresa jornalística que morrer à míngua, sem credibilidade, sem leitores ou audiência e sem anunciantes por conseguinte.

Essa contenda, que de tão ingênua mais se assemelha à peleja do diabo com o dono do Céu, define bem o zeitgeist, o espírito do tempo em que vivemos. A coisa toda é tão ridícula, mas tão ridícula, que adquire força inacreditável. De maneira bastante pungente: parece que quem não se alinha à weltanschauung, à visão de mundo da maioria, pelo menos da maioria onde atua, deve ser eliminado. Não me coaduno com a weltanschauung de quem está no comando, no comando mesmo, por essa razão especificamente, por serem poderosos. Se houver afinidade intelectual, harmonia no que concerne ao modo de pensar, conjunção de opiniões, ótimo; se nenhuma dessas coisas existir, nada feito. E nem adianta jogar charme, oferecer leite com biscoito, dar o espaço mais macio do sofá, coisa alguma. Se sou assim com a diretoria, imagine com quem ainda só quer chegar lá.

Oscar Wilde, escritor e dramaturgo inglês, comparava a imprensa aos métodos medievais de tortura. Teve seus motivos (pesquisem a respeito). Contudo, Wilde viveu entre 1854 e 1900. Desde então, o jornalismo progrediu muito, em todo o mundo, acreditem, e boa parte desse avanço deve-se a profissionais que não cursaram jornalismo ou mesmo comunicação social, a exemplo de Mark Twain, John Hersey, Jon Lee Anderson, Äsne Seierstad, Rubem Braga, Evandro Carlos de Andrade, Roberto Civita, entre outros, para ser sucinto. Os profissionais que são academicamente jornalistas, todavia, como William Waack, Reinaldo Azevedo, Leda Nagle, Celso Freitas, William Bonner, editor-chefe do mais assistido telejornal do país (o que não exime de nenhuma responsabilidade, aliás, é exatamente o inverso: se Bonner pisar feio na bola, o que penso ser difícil, embora não impossível, deve ceder a cadeira a alguém que não tenha nunca cometido erro semelhante), outrossim, são dignos de toda a confiança e admiração — admiração, não servilismo, alienado e boboca —, em especial dos neófitos que se lançam nessa maravilhosa mistura de criação estética, opinião e formação do pensamento que é a arte de sujar os sapatos.

Wednesday, February 11, 2009

 

Poema do dia 2 - Todo quase

Tenho a impressão
De que já rodei o mundo inteiro;
Estou cansado, o ar me falta.
Experimento o gosto amaro
De um amor perverso que me arruína,
Que me entorpece,
Que me faz deixar
De ser quem sou,
Que mina-me as forças, o moral e a moral
E por fim mostra-me
Um outro homem,
Um completo estranho,
Diante do espelho.

Se ao menos
Você se afastasse,
Se ao menos
Eu me pudesse distanciar.
Mas, ao contrário, ao menor sinal
De que vou ser notado, de que me vai pousar em cima
Esses imensos olhos verdes
Abro os braços para você
E permito-me a ilusão sincera,
A ilusão daqueles
Que já levaram muito tombo
E sabem que, mais cedo ou mais tarde
(Que seja mais tarde!)
Serão desprezados.
E sou desprezado.
Mais cedo do que pensei.

Como é possível
Uma criatura que é tanto amor
Viver pelos cantos,
Mendigando um simples olhar,
Sem você, sem um bem,
Sem ninguém que lhe diga
Aquilo, aquela coisa tão simples,
Aquelas palavras demasiado prosaicas,
Cruzar mil vezes uma estrada
E não conhecer essas paragens?

Corcel selvagem
Que não se furta a bom galope,
Escoiceia, corcoveia,
Não se deixa domar em tempo algum,
Vai até a lua
Ainda que não seja necessário,
Dá-se por completo,
Esfalfa-se, corre muito,
Mas sem saber para onde,
E com que propósito,
Ao fim de seu ânimo
Empreende o dobro de seu vigor
Para voltar aos campos planos, serenos
Que tanto contrastam
Com o barro do qual foi feito,
Para que se sinta novamente seguro,
Mesmo que sozinho.

 

Poema do dia 1 - A vida passa

Trago em mim
As marcas indeléveis
Do sofrimento atroz, todo,
Desde tenra infância, essa
Maldição que me aprisiona,
Esse pranto que me inunda a alma escura
Do homem amargurado,
Triste, macambúzio, infeliz, finalmente
Que me tornei.
E que ainda hoje sou.

Tenho tanta sede da felicidade, tanta!,
Quanto o colibri do néctar dos hibiscos
Que indefectivelmente florescem no verão,
Sem características definidas,
Ora amarelos, ora vermelhos
E até alaranjados
A mesclar as duas tonalidades, displicentes,
Indisciplinados, sem personalidade e sem fazerem questão
De ser fiéis a ninguém, com a infidelidade da própria natureza
De seu frágil e dispensável ser.
Porque, sim, os hibiscos que indefectivelmente
Florescem no verão são por completo dispensáveis,
Mas quão desenxabida seria minha vida
Sem eles.

O dia lá fora é tão bonito, tão cheio
De uma chama que está sempre a crepitar,
Cujo nome não conheço, tão repleto
De força, de vigor, de altivez!
Até escuto um bem-te-vi agora
A me injetar um pouco do ânimo
Inerente a sua condição de criaturinha de Deus.
E em algum lugar recôndito de meu espírito saturado
De uma esperança que me apodrece
Sei que é belo e nobre,
Disseminando com o canto mavioso
Alguma razão para acreditar,
Para saber com toda a certeza
Que devo ansiar pelo novo dia não tarda.

A vizinha me quer falar e eu respondo:
"Diga lá, ó, minha amiga, o que deseja a senhora?".
Ela me repreende, cheiro de feijão
Bem temperado a urgir na panela.
Lembra-me de que não gosta
Que a trate com tamanha cerimônia.
Justifico-me; falo que tanta formalidade
Deve-se aos meus verdes anos
Passados em colégios rigorosos,
De padres, quando menino,
E de militares, já mais taludo
(mas ainda menino).

Tenho em mim cinco mil velhices,
tenho em mim saudades de cinco mil mães
Cujos filhos partiram para guerras em outras pátrias,
Tenho saudades de tudo,
Sou saudade pura.
No entanto, não sinto a mais insignificante falta
Daqueles colégios, daquelas masmorras,
Daquela gente de mim tão distinta, tão distante, de que nunca gostei
E que jamais teve para comigo
Um gesto sincero e desinteressado.
Neles sempre fui o bom menino
Que sempre aprendia a lição
(Que o digam os mestres, se duvidam de mim),
Que sempre repartia com os colegas
O lanche farto da merendeira azul,
Preparado pela mãe, rainha não só do lar
(Eles estão por aí, nos lugares em que não estou,
E podem confirmá-lo, os exploradores, agora sei).
E para quê? Olhem o que recebi como paga!

Naquelas madraças, que eram
Ainda maiores àquela época,
Era o petiz comportado,
Mas que fazia das suas artes de quando em quando,
Afinal, nunca fui santo
Nem nunca o quis ser.
Nem santo, nem padre, nem mesmo militar:
A invulgar normalidade me basta,
Livre, apenas. Nada. Ninguém.
Lá era o menino
Puro e ingênuo
Que nunca deixei de ser, agora maiorzinho, um pouco,
Que sempre gostou de hibiscos e colibris,
E dos passarinhos cinzentos ou de todo negros. mais
E que nunca precisou de escola para isso
E alguém precisa de escola para o que de fato interessa?
Só das bibliotecas,
Das bibliotecas, meu terno refúgio,
Toda a vida precisei.

Lá, inclusive, entre todos os outros lugares por onde andei,
Foi ganhando corpo
O homem amargurado,
Triste, macambúzio,infeliz, finalmente,
Que já era, que sempre fui,
Antes mesmo de ver a luz deste mundo.
E que nunca deixou de se inquietar
Por não saber a que se presta.
Que fracassou de modo convicto:
Sou ninguém. E sendo ninguém, posso ser tudo o que quiser.
Que tem um medo louco
De ser infeliz para sempre;
Que escuta solos de saxofone
Até que o galo cante
E haja vida outra vez.

Aqui estou, sem máscaras para mim:
O homem imperfeito, que assim será por toda a caminhada.
O homem que não sabe
Nada do mundo, e não se importa por isso,
Porque essa é a sua constituição.
Que vai chegar ao fim sem saber.
Quanta saudade tenho da vida
E de tudo o que não significa mais.
Entretanto, habita em mim,
Na mesma proporção,
O sentimento inverso
Ao que se define por saudade
(E que não sei nominar. Quem sabe possa ser chamado procura?, ou descoberta,
Se me presentear o destino).
Tenho sede por tudo o que há de vir.
Tudo, rigorosamente.

Pulsa em mim
O desejo de viver
Tudo o que não pude
Ou que não quis.

Sunday, January 25, 2009

 

O rinoceronte está na sala 2 - Tudo diferente, mas igual

Por Sérgio Dávila

Horas depois de Barack Obama nomear o veterano diplomata Richard Holbrooke para ser o enviado especial do governo norte-americano ao Afeganistão e ao Paquistão e "avançar a diplomacia naquela região", um ataque atribuído aos EUA matou 15 pessoas na fronteira entre os países.O alvo original era a casa de um comandante do Taleban no Waziristão do Sul, conhecido por ser um reduto da milícia que governava o Afeganistão até 2001, mas o míssil teria atingido a residência de um líder tribal que colaborava com o governo paquistanês. Ele e quatro membros de sua família teriam morrido no ataque.Em tempo recorde, o novo presidente viu seu discurso pacifista e conciliatório ser confrontado pela realidade das ações militares do país que comanda. O ataque não pode ter ocorrido sem seu aval, já que desde antes de assumir o democrata recebe relatórios diários de toda atividade militar levada a cabo em diversos pontos do mundo e, desde terça, tem a palavra final sobre elas.A mesma discrepância deve ocorrer em relação ao Iraque. A retirada do país em até 16 meses após a posse foi um dos pontos principais da plataforma do candidato. Na quarta-feira, após sua primeira reunião com o alto comando do Pentágono, incluindo os militares em campo naquela região, Obama voltaria a recalibrar sua retórica.Na saída do encontro, soltou declaração em que dizia que pediu a sua equipe que "se engajasse em planejamento adicional necessário para executar uma redução militar responsável do Iraque". Sumiram do discurso os 16 meses. Relatos posteriores da reunião dão conta de que os militares desaconselharam o presidente a se prender numa data.
Alerta
Em entrevistas dadas nos últimos dias, Ryan Crocker, que está deixando o cargo de embaixador americano no país e que participou da reunião com Obama, foi mais explícito. Há "sérios riscos" de uma volta da insurgência se os EUA saírem do Iraque precipitadamente, disse o diplomata apontado por George W. Bush.Para ele, a perda de confiança da população local teria um "efeito devastador". "Não estou dizendo que vá acontecer, mas há o risco de que ocorra", afirmou. Há hoje 142 mil soldados norte-americanos no país, número alcançado depois da escalada ordenada por Bush em 2006. Muitos atribuem a atual situação de estabilidade a esse aumento das tropas.Outros dizem que ela veio por conta de uma aliança entre lideranças sunitas contra militantes da organização terrorista Al Qaeda. Em público, a proposta de retirada de Obama tem apoio do general Ray Odierno, o mais graduado comandante militar na região, para quem a realização de eleições iraquianas pacíficas neste ano seria a prova definitiva de que a saída é possível.O Iraque vai às urnas para pleitos nas Províncias no dia 31 de janeiro e faz eleições nacionais no fim do ano. A promessa de Obama era deixar tropas residuais no país, sem data de saída, e remanejar 30 mil soldados para o Afeganistão, onde ele acredita estar o verdadeiro centro da chamada "guerra ao terror". O resto viria para casa.No dia seguinte à reunião de quarta, sua proposta ganhou o apoio público do comandante dos fuzileiros navais. "A hora é essa para os marines deixarem o Iraque", disse o general James Conway. Há hoje 22 mil fuzileiros no país.
Comento
E agora, B.O.?

 

O rinoceronte está na sala 1 - O buraco é mais embaixo

Por Sérgio Dávila, na Folha. Comento em seguida.
"E, assim, dizemos a todos os povos e aos governos que nos estão assistindo hoje, desde as capitais mais grandiosas até o pequeno povoado em que meu pai nasceu: saibam que a América é amiga de cada país e cada homem, mulher e criança que busca um futuro de paz e de dignidade, e saibam que estamos preparados para liderar novamente."São 60 palavras de um parágrafo solto no meio do discurso de posse de Barack Obama como presidente dos EUA, na terça-feira, mas são as que mais barulho vêm fazendo entre formadores de opinião progressistas, do autor britânico Thimoty Garton Ash ao humorista norte-americano Jon Stewart, passando pelos especialistas em relações exteriores Richard Haass e Peter Beinart, entre outros.Depois de oito anos do unilateralismo belicista da dupla republicana George W. Bush-Dick Cheney, o democrata Barack Obama angariou boa parte da boa vontade mundial e dos votos domésticos com uma plataforma multilateral, a promessa de um mundo em que os Estados Unidos dividem o centro de decisões com outros atores. Não um mundo em que o país "está preparado para liderar novamente".Obama repetiria as palavras dois dias depois, na cerimônia de posse de sua secretária de Estado, Hillary Clinton, na Chancelaria norte-americana. Os EUA "podem estar prontos para liderar novamente, mas e se o mundo não estiver mais disposto a seguir?", perguntou Garton Ash em artigo publicado dois dias depois da posse."E se o mundo acreditar que a América perdeu muito de seu direito moral de liderar nos últimos oito anos, não tem mais o poder que costumava ter e, de qualquer maneira, nós estamos caminhando para um sistema global multipolar, como o próprio Conselho Nacional de Inteligência de Washington prevê?", indaga-se o britânico, citando relatório da entidade, que reúne a comunidade de inteligência dos EUA, divulgado no fim do ano passado.É o que o autor Peter Beinart chama de "bolha de poder" do país, fazendo um paralelo com a bolha imobiliária norte-americana cujo fim deu origem à crise econômica atual. Tanto uma como a outra estouraram, defende ele, e Obama tem de aprender a viver nos novos tempos. "Bush e Dick Cheney eram como os proprietários de imóveis que se endividaram cada vez mais, certos de que eles poderiam se safar porque o valor de sua casa iria crescer para sempre", afirma.Mas os compromissos militares e ideológicos dos EUA cresceram muito além da capacidade do país de honrá-los, argumenta o autor de "The Good Fight - Why Liberals -And Only Liberals- Can Win the War on Terror and Make America Great Again" (A Boa Luta -Por Que os Progressistas -E Só os Progressistas- Podem Vencer a Guerra ao Terror e Fazer a América Grande Novamente, HarperCollins, 2006).
Razões do estouro
"E agora a bolha do poder estourou. Militarmente, movimentos guerrilheiros selvagens e espertos aprenderam a sangrar nosso dinheiro, nossas vidas e membros. Economicamente, os recursos estão escassos; é difícil pagar para transformar o Oriente Médio quando nós estamos afundados em débito, tentando recuperar o Meio-Oeste. E, ideologicamente, a democracia não parece mais o destino inevitável de toda a humanidade."Pela mesma linha segue Richard Haass, presidente do influente Council on Foreign Relations, centro de pensamento baseado em Nova York, cujo nome frequentou listas nos últimos dias para fazer parte da alta diplomacia obamista em formação. Para ele, o novo presidente vai enfrentar mais restrições do que qualquer de seus antecessores recentes."A era da unipolaridade americana acabou", afirma Haass. "Obama vai herdar um mundo no qual o poder em todas as suas formas -militar, econômica, diplomática e cultural- é mais igualmente distribuído do que nunca." Isso significa, acredita ele, que o ocupante da Casa Branca vai ter de lidar com um maior número de ameaças, vulnerabilidades e atores independentes que "podem resistir a se sujeitar ao desejo dos EUA".De mais a mais, nesse ponto a retórica do novo presidente lembrou a de seu antecessor. Como disse mais candidamente o humorista Jon Stewart em seu influente programa de TV, no dia seguinte à posse, ao exibir o trecho do discurso: "Nós já não ouvimos isso antes?"
Comento
A festa, definitivamente, parece ter acabado. Oxalá este episódio seja capaz de, aos poucos, resgatar profissionais de imprensa do mundo inteiro da letargia mental que se encontram com a ascensão de Barack Obama ao poder. O norte-americano comum já havia caído na real há muito tempo, se é que em algum momento, desde a eclosão da crise econômica em Wall Street, houve espaço para ilusões e delírios obamófilos. Quando engodos políticos são alçados a refinada categoria de enredo de pilhérias em programas de televisão, a exemplo do que nós aqui de baixo bem sabemos, já era, segundo diria a voz rouca das ruas. Esculhambado uma vez, sempre ridicularizado.

Saturday, January 24, 2009

 

Poema do dia: Contradições fundamentais de um condenado

Sou qualquer coisa que não eu mesmo.
Sou o acúmulo de sujeira e pó de meus fracassos
Ancestrais, aqueles que nem conheço e
Que me fazem chorar como homem feito.

Sou a encarnação do colapso.
Ah! meu Deus, como eu queria
Ter sido outro, que a vida
Tivesse sido outra.
Mas não pude, não foi possível.

Um homem arruinado, uma alma
Despedaçada, um corpo maltratado pelo tempo,
Olhos que se embaciam com mais freqüência
Do que eu desejava.

Não pertenço ao mundo que me cerca:
Tudo é-me estranho, escuro,
Frio, distante.
Vim a este mundo devido a um mero acaso
E assim nele sigo, por covardia e por um medo louco
De obedecer a meus instintos mais hediondos.
E por estar alijado
Desse mesmo mundo que me rodeia
Construo o meu próprio mundo,
Um mundo que também me é desconhecido,
Um mundo que poderia vislumbrar tão fácil
Quanto o simples abrir de uma janela,
Que vive cerrada e me provoca
Um calor infernal.
Nunca cheguei ao parapeito,
Não por falta de curiosidade, mas
Por falta de vontade.

Quis um dia pôr a cara para fora
E sentir o hálito alvo e fresco
Do sol da manhã que se anunciava.
Não havia sol, não havia sequer uma manhã, nunca houve!
Era tudo névoa, era tudo esquecimento.

Imaginei encontrar a felicidade,
Essa coisinha besta, tão reivindicada por todos;
No entanto, só o que vi
Foi o sono amaciado por aguardente
De alguém que dormia no chão da realidade,
Ao relento.

E um pássaro, a voar tão alto, e tão longe
E tão inalcançável, que se perdia
Em uma franja azul desbotada
No telhado do céu sem limites.
O mundo inteiro existe:
O pássaro, o bêbado, o aguardente.
Menos eu.

 

Morre modelo que teve mãos e pés amputados no Espírito Santo









Na Folha Online:



A modelo Mariana Bridi da Costa, 20, que teve as mãos e os pés amputados, morreu na madrugada deste sábado, por volta das 2h30, no Hospital Estadual Dório Silva, na cidade de Serra (ES). De acordo com a assessoria do governo do Estado, o óbito foi "decorrência de complicações de uma infecção generalizada gravíssima".



A modelo teve uma infecção causada pela bactéria Pseudomonas aeruginosa, que evoluiu para sepse grave (infecção generalizada). Segundo nota da Secretaria da Saúde do ES, o quadro teve "como foco uma infecção urinária". Ontem (23) o estado de saúde da jovem já era considerado gravíssimo pelos médicos.
Modelo sucumbiu à infecção
generalizada, iniciada por bactéria


Mariana iniciou a carreira de modelo aos 14 anos. Em 2007, ela ficou em 4º lugar no concurso Miss Mundo Brasil. No ano passado, obteve a mesma colocação na competição. A modelo estava internada no Hospital Dório Silva desde o dia 3 de janeiro, respirava através de aparelhos e fazia hemodiálise. Na última terça-feira (20), a jovem passou por uma cirurgia para amputar as mãos --que ficaram necrosadas. Na semana passada, o mesmo aconteceu com os pés.





De acordo com o infectologista Caio Rosenthal, do hospital Albert Einstein, não é comum que casos de infecção por Pseudomonas evoluam para a amputação dos membros. "A Pseudomonas aeruginosa é a mais comum da espécie nas infecções urinárias. A necrose acontece quando a bactéria causa uma infecção tão grave que impede que o fluxo sanguíneo atinja extremidades."






Comento






Enquanto não houver investimentos vultosos em saúde pública no Brasil, o que compreende profissionais gabaritados e com conhecimento além do obrigatório para se ser aprovado em concurso, casos semelhantes a esse continuarão a ser registrados. Muita pena. Costa era ainda muito jovem e linda, como atesta a foto, com crédito de Octavio Bastos.

 

Direita sai fortalecida em Israel após guerra em Gaza

Leiam o seguinte. Comento logo abaixo.

Por Marcelo Ninio, na Folha:

O governo de Israel passou os 22 dias da ofensiva na faixa de Gaza negando que a proximidade das eleições tenha tido algum peso na decisão de ordenar os ataques contra o Hamas. Mas, mesmo que a política não tenha motivado a guerra, pesquisas de opinião feitas depois do cessar-fogo mostram que a guerra influenciou a política. A menos de três semanas da eleição que definirá o novo governo do país, no dia 10 de fevereiro, a guerra reforçou a guinada à direita dos últimos anos no cenário político israelense. Ao mesmo tempo, recolocou a segurança como o tema principal da campanha, antes dominada pela crise econômica. Além de reduzir as diferenças ideológicas entre os discursos dos três principais candidatos ao cargo de primeiro-ministro, essa tendência fortaleceu a ultradireita, sobretudo o partido Israel Beitenu (Israel Nossa Casa). Seu polêmico líder, Avigdor Liberman, desponta como um dos destaques da votação. De acordo com uma pesquisa divulgada pelo jornal "Yediot Ahronot", o mais popular do país, o partido conservador Likud receberia o maior número de votos se os israelenses fossem hoje às urnas. Em segundo lugar ficaria o Kadima, da chanceler Tzipi Livni, e em terceiro o Trabalhista, do ministro da Defesa, Ehud Barak.
A dianteira do partido do ex-premiê Binyamin Netanyahu, contudo, não lhe garante a formação de um novo governo. Segundo a pesquisa, o Likud teria 29 das 120 cadeiras do Knesset (Parlamento), tornando necessária uma aliança com pelo menos outros dois partidos. O Kadima teria 25 deputados, e os trabalhistas, 17. Criado há dez anos com uma plataforma acusada de racista, por questionar o direito de cidadania dos árabes do país, o Israel Beitenu pularia dos 11 deputados que tem hoje para 14. Portanto, a uma distância mínima do Partido Trabalhista, herdeiro dos pioneiros socialistas que fundaram Israel. Na pesquisa do jornal "Maariv", o segundo mais lido, a diferença desaparece, com trabalhistas e ultradireitistas empatados em 16 deputados.
Nesta semana, a Suprema Corte derrubou decisão da Comissão Eleitoral do Knesset de barrar os partidos árabes das eleições, iniciativa liderada pelo Israel Beitenu. Mesmo com o veto, o jornal de esquerda "Haaretz" manifestou em editorial temer uma "libermanização" da política israelense, que teria como vítima principal a minoria árabe (20%). As preferências partidárias não são a única indicação do endurecimento de opiniões. Quase metade dos entrevistados acha que os ataques deveriam ter continuado até a reocupação de Gaza. Na véspera da ofensiva, a grande maioria rejeitava essa possibilidade."A segurança voltou ao centro do debate", escreveu a colunista do "Yediot Ahronot" Sima Kadmon. "Depois de período em que todos [os candidatos] se fantasiaram de economistas que nos tirariam da crise, a tendência se inverteu totalmente."A guerra melhorou a performance dos três principais candidatos. Livni e Barak, que comandaram a guerra ao lado do premiê Ehud Olmert, saíram fortalecidos por atenderem à pressão pública, que esperava uma resposta a oito anos de foguetes disparados de Gaza. Netanyahu, que sempre defendeu a opção militar, manteve o status de quem tem melhor sintonia com o eleitorado. O apoio da quase totalidade dos israelenses à ofensiva explica a insatisfação de boa parte do público com o desfecho. Quase metade concorda com Liberman em que os ataques só deveriam ter sido suspensos após a queda do Hamas. Na esplanada do Muro das Lamentações não há um único cartaz eleitoral. A polícia proíbe a propaganda política no local mais sagrado para o judaísmo, mas poucos escondem seu sentimento. "Voto no Liberman porque ele é o único que vai direto ao ponto: se o Hamas quer acabar com Israel, Israel tem que acabar com o Hamas antes", disse Efraim, 23, estudante de uma escola religiosa na cidade velha de Jerusalém.

Comento

O saldo da interrupção dos conflitos bélicos em Gaza é positivo para o ultradireitista Israel Beitenu, mas que Avigdor Liberman, não se iluda: isso é mais uma estratégia do Hamas para continuar a guerra em uma outra oportunidade e permanecer abocanhando todas as atenções da opinião pública mundial, situação a ser indefectivelmente agravada se eleito Liberman, líder de agremiação francamente contrária à milícia terrorista.
O Hamas já deixou bastante claro que encara o terror como um método. Que Israel, sejam quem forem seus novos governantes, estam (ainda mais) preparados.

Sunday, January 18, 2009

 

Déjà vu

Ao longo de minha vida letiva e de minha carreira universitária, fui muitas vezes tomado de assalto por uma sensação muito peculiar -e extremamente desagradável: a de já ter produzido textos muito parecidos, para não dizer iguais, ao que lia. A picaretagem da acadimia brasileira, inclusive de parte de professores ignorantes e que permitiam que suas ideologias, um tanto idiossincrásicas demais, comprometessem o gabarito de seu desempenho profissional, é algo que jamais irá deixar de me fazer espumar de raiva. Essa gente tinha é de entrar no pau-de-arara das idéias (as minhas ainda com acento agudo) e arder no fogo do inferno intelectual.
Por que um intróito de tamanha agressividade?, há de estar se perguntando o leitor amistoso. Dia desses em consulta àquele sítio para postagem de vídeos, encontrei uma página cuja retranca era: EU, GIANCARLO, AGRADEÇO AOS AMIGOS VISÍVEIS E INVISÍVEIS! Dupla coincidência, afinal o protagonista do enredo era um meu homônimo e a mensagem contida na oração após o vocativo é muito similar ao título de um artigo de minha lavra, publicado aqui mesmo neste weblog. Coincidência demais, realmente.
Minha alminha cheia de pruridos cristãos, entretanto, diz que é melhor olvidar o episódio, devido aos motivos nobres e comoventes do discurso. All right. Mas fica aqui o desabafo e o manifesto (como dizer isso sem parecer tão pesado e cru?): tudo tem limite. Até o altruísmo.

Thursday, January 01, 2009

 

Curto e grosso & desterro

Já estou de volta, antes mesmo do que imaginava, para ser franco. Penso ser um bom presságio ter algo a publicar neste espaço virtual logo no primeiro dia do ano: dois textos, de uma tacada só. Que assim seja. O primeiro é um haicai, gênero poético de origem japonesa, descomedidamente sucinto, popularizado no Brasil a partir do início do século XX. Em seguida, vem um poema mais extenso, de 26 versos. Boa leitura e que 2009 nos seja leve.


Des-tino

Não posso crer
Que você jogue tudo fora assim
E abdique de você e de mim.



A caminho de lugar nenhum

Perdido em um torvelinho
De pensamentos ruidosos
Que minam-me o sono
E a saúde e me aproximam da beleza.

Escrevo estas nove ou dez
Dúzias de palavras que o vento
Há de carregar para longe,
Para bem longe de mim
E que depois de rodar
O mundo inteiro, como eu um dia farei,
Voltam para mim, como as aves de arribação
Regressam ao Velho Mundo,
Sua verdadeira casa.

Ruínas sem tradição me circundam
Com seus meninos a gritar
Em brinquedos e histerias
Enquanto cães raivosos

Vindos dos infernos mais escaldantes
Ladram furiosos como a chuva
Que estronda no telhado fino.
Sigo. Paro.
Exilado em minha própria vida,
Abrigado em castelos
Portentosos feitos de nuvem,
Prisioneiro do mundo que criei,
Erijo monumentos em ouro aos que desfiguram.

This page is powered by Blogger. Isn't yours?